A última chance dos republicanos


Gideon Rachman
Valor Econômico,   28 de Agosto de 2012

  A história política mais significativa nos EUA neste ano nada tem a ver com a política. Veio em um artigo no "The New York Times" intitulado "Brancos representam menos de metade dos nascimentos nos EUA". Parte do sentimento de medo e ira que muitos eleitores republicanos dirigem contra Barack Obama está certamente relacionada com a percepção de que o presidente representa "a outra América", os EUA não brancos que acabarão por constituir uma maioria na população do país. É possível perceber a raiva no popular slogan "Quero meu país de volta". Podemos vê-la na cobrança, na convenção do partido, por políticas cada vez mais duras contra imigrantes ilegais. Podemos identificar traços dessa raiva nas denúncias de conotação racial contra o "Obamacare", que tem por objetivo proporcionar cobertura de saúde a 44 milhões de americanos não segurados.
Um importante estrategista argumenta que a eleição de 2012 já se resume a uma batalha entre economia e demografia. Economia fraca e desemprego alto favorecem os republicanos. Mas as tendências da demografia beneficiam os democratas. As mudanças no perfil demográfico americano e as considerações políticas que as caracterizam colocam um grande dilema estratégico para os republicanos. Um importante estrategista partidário argumenta que a eleição presidencial de 2012 já se resume a uma batalha entre economia e demografia. Economia fraca e desemprego elevado favorecem os republicanos. Mas as tendências demográficas beneficiam os democratas. O crescimento do voto hispânico significa que três Estados onde George W. Bush venceu em 2004 - Nevada, Colorado e Novo México - estão se inclinando em favor de Obama.
A Califórnia, maior Estado do país e Estado natal de Richard Nixon e de Ronald Reagan, votou nos republicanos em todas as eleições presidenciais de 1968 a 1988. Mas os democratas lá ganharam desde 1992 e Obama está seguramente na dianteira, lá. Muitos analistas identificam a mudança na preferência estadual pelos republicanos aos "ataques" cada vez mais estridentes contra a imigração ilegal. As pesquisas mais recentes ressaltam em que medida Mitt Romney vai mal entre os hispânicos. Uma pesquisa NBC-Wall Street Journal na semana passada mostrou que Obama lidera entre os hispânicos por 63% a 28%. O campo de Romney fala esperançosamente sobre ampliar sua participação para 38% do voto hispânico até o dia das eleições, mas é difícil acreditar nisso.
Havia rumores de que o candidato republicano poderia escolher o senador Marco Rúbio, da Flórida, um cubano-americano, como seu companheiro de chapa. Mas ele optou pelo congressista Paul Ryan - cuja escolha parece, segundo as pesquisas, ter efetivamente diminuído o apelo da chapa junto aos eleitores hispânicos. A convenção do Partido Republicano em Tampa deverá adotar uma plataforma partidária de linha dura em questões cruciais para os eleitores hispânicos, em especial a imigração ilegal. Na convenção, será reivindicada a conclusão da construção de uma cerca com dupla camada, na fronteira com o México, e a adoção de um sistema eletrônico, chamado "E-Verify", exigindo que todos os empregadores confirmem o status legal de novos contratados. Até mesmo a maioria dos hispânicos, que têm todo o direito de viver nos EUA, tendem a se opor às políticas focadas nos ilegais ou que os ameacem com deportação. Durante as primárias, Romney manifestou-se a favor de "autodeportação" - termo que empregou para indicar a adoção de leis trabalhistas tão rígidas que os imigrantes ilegais veriam-se na impossibilidade de encontrar trabalho e optariam por voltar para casa. Como suspira um estrategista republicano: "É difícil conseguir que as pessoas votem em você quando, para começo de conversa, elas acham que você não as quer no país". A caminho da convenção, Romney tinha se igualado a Obama, segundo muitas pesquisas. Ele, claramente, tem uma boa chance de vitória. Mas, se perder, as chances de os republicanos reconquistaram a Casa Branca diminuirão a cada eleição - a menos que consigam um desempenho muito melhor entre os eleitores minoritários, em geral, e os eleitores hispânicos, em particular.
Neste momento, cerca de 63% da população americana é branca. Mas, por volta de 2040, o país provavelmente terá um perfil "maioria-minoria". Os hispânicos representam atualmente 16% da população americana. Mas 26% dos bebês nos EUA, no ano passado, nasceram em famílias hispânicas. Os republicanos correm o risco de ficar aprisonados num círculo vicioso. Em razão de tantos eleitores participantes em suas primárias serem "anglos" idosos revoltados com as mudanças demográficas nos EUA, os candidatos à indicação pelos republicanos são mais ou menos obrigados a adotar posições radicais na questão da imigração, que provavelmente pesarão muito contra eles quando pedirem votos ao eleitorado hispânico na eleição geral. Republicanos confortam-se imaginando que a filiação dos eleitores hispânicos poderá mudar ao longo do tempo. Muitos hispânicos têm posições socialmente conservadoras que poderão se encaixar bem no moderno Partido Republicano. Ted Cruz, candidato do partido ao Senado dos EUA pelo Texas, em novembro, é latino-americano e um queridinho do movimento Tea Party. Candidatos como Cruz e Rubio mantêm acesa a esperança de criar um Partido Republicano que seja bem mais atraente aos eleitores hispânicos. No entanto, os republicanos não podem assumir que um grande número de hispânicos aderirão mais ao partido com o passar do tempo. As atitudes políticas que se formam nos duros anos iniciais, na esteira da chegada das pessoas aos EUA, podem ser muito duráveis. A grande maioria dos judeus ainda vota nos democratas.
A incapacidade de atrair os votos das minorias étnicas em geral e, em particular, dos hispânicos, é uma grande desvantagem para os republicanos nessa eleição, mas uma chapa Romney-Ryan ainda poderá superá-la. Em eleições futuras, ela poderá ser fatal. Romney enfrenta uma batalha muito difícil, nos próximos meses. Futuros candidatos republicanos poderão concluir que o trabalho dele foi fácil. (Tradução de Sergio Blum)
Gideon Rachman, Financial Times